Por Daniel Martins, CEO e Diretor de investimentos.
A abertura comercial vivida pelo Brasil, principalmente a partir do início da década de 90, trouxe uma série de impactos positivos para a economia. Embora se reconheça que há muito a se fazer nesse quesito, afinal o fluxo comercial (soma de importações e exportações) no Brasil ainda é de cerca de 23% do PIB, enquanto tal percentual chega em 40-50% nas maiores economias do mundo, é fato que os brasileiros têm a seu dispor muito mais opções de consumo atualmente do que era verdade até a década de 80.
Encontramos facilmente produtos estrangeiros no supermercado, carros importados e roupas fabricadas em outros países. Consumimos conteúdo produzido por empresas internacionais, através de aparelhos celulares ou televisores fabricados, em sua grande maioria, por empresas não brasileiras. Se resolvemos ficar em casa para assistir filmes ou séries por streaming, este também vem de fora. Assim como as redes sociais, que viraram parte do dia-a-dia de brasileiros de diferentes gerações.
Consumidores antenados que somos, nossas despesas já são globais.
Entretanto, ao olharmos nossos investimentos, o mesmo não é verdade. A poupança nacional ainda tem muito pouca exposição a ativos globais. De fato, estima-se que menos que 3,5% da poupança nacional esteja alocada atualmente em ações globais. Basta nos compararmos com outros países para percebermos quão baixo é este percentual. Afinal, tal parcela ultrapassa 50% em economias desenvolvidas, como Reino Unido, Alemanha, Canadá e Dinamarca. Estamos atrasados mesmo quando comparado a outras economias da América Latina, como México (13%), Colômbia (27%), Chile (28%), e Peru (42%).
Ao se ter pouca exposição global, nossos investimentos acabam ficando muito correlacionados entre si, sujeitos aos mesmos riscos político-econômicos. A não ser pela exposição que as empresas brasileiras têm em outros mercados, ficamos de fora de oportunidades de crescimento disponíveis em outros países. Se o Brasil representa cerca de 3% do PIB mundial, ignoramos os outros 97%, excluindo-nos de todo potencial de criação de valor representado por boa parte do mundo.
Ficamos também de fora de modelos de negócios superiores àqueles aqui existentes. Como investidores, não nos beneficiamos da força de diversas empresas centenárias, presentes em outras geografias há anos. Também não nos beneficiamos de inovações e tecnologias que são desenvolvidas e integradas em modelos de negócio lá fora, antes de virem para o Brasil.
Da mesma forma, ficamos de fora de setores da nossa economia que não estão representados em nossa bolsa de valores local. Afinal, boa parte da economia brasileira é servida por empresas multinacionais aqui presentes, as quais, apesar de produzirem e gerarem empregos localmente, não estão disponíveis para investimento no Brasil com a mesma facilidade.
Tal característica cria um contrassenso: por falta de conhecimento ou acesso, os brasileiros, em sua grande maioria, investem muito pouco nas empresas que escolhem ser clientes. Alocam parte do seu salário na compra de seus produtos, satisfeitos como consumidores, mas não se beneficiam da mesma maneira como investidores. Ao consumir seus produtos, ajudam na rentabilidade da empresa, mas não se beneficiam diretamente dela.
A boa notícia é que o Brasil já começou a andar nessa direção. Nos últimos anos, gestoras especializadas em ativos globais surgiram no Brasil. Novos produtos foram e estão sendo criados. Bancos tradicionais e plataformas independentes vêm aumentando o foco na distribuição de produtos com este apelo. É crescente o número de profissionais e recém-formados interessados em entrar para este mercado. E é também crescente o interesse dos brasileiros por esta classe de ativo.
Quem ganha é o investidor, que começa a ter acesso a produtos até então disponíveis apenas àqueles com renda muito alta. Quem ganha é o Brasil, com maiores e melhores opções para investir sua poupança nacional, principalmente no cenário atual, e provavelmente persistente, de juros mais baixos na economia.
Que chegue um dia em que consideraremos investir nosso patrimônio com a mesma liberdade de escolha que temos na hora de definir o que consumimos. Que poderemos acessar cada vez mais, diretamente ou através de gestoras especializadas, estas mesmas empresas que já fazem parte da nossa economia. Que nossos investimentos tenham exposição a modelos de negócio que nos fascinam como consumidores. Que possamos nos beneficiar não apenas do poder da diversificação que um portfólio global traz, mas também do potencial de rentabilidade que tais empresas oferecem. Rentabilidade esta que nós mesmos, como consumidores, ajudamos a sustentar.
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